Em 12 de junho de 1972 John Lennon, vinha de um grande sucesso comercial e de crítica, com seu álbum anterior, Imagine (1971), quando lançou Some Time in New York City. A decepção foi enorme. A crítica caiu de pau, disse que as canções, todas de protesto, eram horríveis, infantis, as piores já feitas por um Beatle e outras coisas piores. Para piorar o disco ainda foi um fracasso de público e de vendas, atingindo apenas a posição 11 nas paradas inglesas e a 48 nas americanas.
Passados 47 anos, enquanto eu lia a biografia de Angela Davis, fui lembrando como o ambiente político estava no mundo daquela época, em especial nos Estados Unidos, me lembrei desta obra de John. Daí a pergunta: Será que “Some Time in New York City”(John Lennon e Yoko Ono) é tão ruim quanto foi considerado na época ?
” A música pop e rock é arte? Claro que é, e é sem dúvida a forma de arte mais admirada do mundo. John Lennon e Yoko Ono pensaram o mesmo e seu álbum de 1972, Some Time in New York City foi uma tentativa genuína e sincera de tornar a arte da música popular vital e significativa, de uma maneira que poucos artistas contemporâneos tentam fazer. Era sua noção de que a música deveria ser como um jornal, relatando e comentando questões contemporâneas e fazendo com que a música fosse ouvida de uma maneira que conduzisse a narrativa e fizesse a diferença.”
Não por acaso, sua capa era como uma página de jornal, em que as notícias eram as letras músicas. O disco é política pura e John não poupa quase ninguém de sua ira.
Escutando atentamente hoje dá para entender porque ele incomodou tanto na época. Não é fácil botar o dedo em algumas feridas ardidas. Muito do que é criticado no disco estava sendo radicalmente discutido nos Estados Unidos e no mundo. A posição da mulher na sociedade (Woman is the nigger of the world), o racismo ( Angela), as más condições das prisões (Attica State, Born in a Prision), a situação da Irlanda do Norte ( Sunday, Bloody Sunday (sim a ideia deste título que ficou famoso com o U2 é de Lennon) e The Luck of the Irish), o envolvimento da polícia com a corrupção no combate às drogas (John Sinclar) e igualdade (We’re All Water, Sisters, O Sisters). Até parece um disco para o nosso Brasil (mundo) de hoje.
Um vídeo histórico: John & Yoko Live no Mike Douglas Show em 18/02/1972. Originalmente a transmissão foi censurada, esta versão foi restaurada para incluir as partes originalmente editadas.
Mas ao contrário do que foi dito na época, também é um disco que tem ótimas músicas, metade das quais são escritas por John e por Yoko juntos. Será que as críticas da época não teriam sido apenas uma inflamada reação de uma minoria branca, wasp (White, Anglo-Saxon and Protestant) incomodada? Escute e tire as conclusões você mesmo:
Walter Rosciano Franco (São Paulo, 6 de janeiro de 1945 — São Paulo, 24 de outubro de 2019)
Um dos mais intrigantes e polêmicos músicos brasileiros partiu . Walter Franco não fez parte de nenhum movimento musical específico. Não participou da bossa nova ou tropicalismo, mas sempre esteve na vanguarda. Walter incomodou, acho que esta é a palavra certa. Fez parte da Vanguarda Paulista, e da geração de Arrigo Barnabé e Itamar Assumpção. Trabalhou com arranjadores como Rogério Duprat e Júlio Medaglia, e teve a letra da música “Cabeça” traduzida para o inglês por Augusto de Campos. Seu álbum mais aclamado pela crítica é Revolver, de 1975, ao meu ver uma obra prima.
O compositor tem pelo menos cinco músicas bem conhecidas do grande público: a própria “Cabeça”, “Seja Feita a Vontade do Povo”, “Coração Tranquilo”, “Respire Fundo” e “Vela Aberta”, sendo a última executada até hoje em programas radiofônicos de flash-back.
Outro sucesso de Walter Franco é “Serra do Luar”, com um refrão marcante: “Viver é afinar o instrumento / De dentro prá fora / De fora prá dentro”.
Na sua escuta diária do vos lançamentos, o Vitrola ouviu Peter Doherty & Puta Madres, uma banda multinacional, formada por Pete Doherty (vocais, guitarra rítmica) ex-Libertines e Babyshambles. O primeiro álbum da banda, é chamado Peter Doherty e The Puta Madres, foi lançado em 26 de abril de 2019.] Em 28 de janeiro, eles lançaram seu single de estréia, “Who’s Been Being You Over“, seguido de “Paradise is Under Your Nose” em 5 de abril. O som da banda é muito gostoso e me remeteu a Dexy’s Midnight Rangers. Muito bom. Curtam:
Membros:
Pete Doherty – vocais, guitarra ritmica, sitara, letras (2016–presente)
E ai cansado de escutar sempre as mesmas músicas ? Pois saiba que há muita coisa boa rolando por aí. O Vitrola faz questão de escutar muito do que sai. Achamos que é hora de compartilhar com vocês. Conheçam ou apreciem bandas como Helado Negro, Parquet Court, Deerhunter, Sharon van Etten , Lambshop e outras.
João Gilberto do Prado Pereira de Oliveira OMC (Juazeiro, 10 de junho de 1931 — Rio de Janeiro, 6 de julho de 2019)
Acho que todo mundo já escutou e leu muito sobre João Gilberto nestes últimos dias, mas um blog como o Vitrola dos Sousa que ama a música, principalmente música de qualidade, não poderia deixar e prestar sua homenagem a este ícone mundial. Na primeira vez que prestei a atenção em João Gilberto eu tinha em torno de 18 anos e fiquei curioso com a letra de uma música que dizia:
“Rua Nascimento Silva, cento e sete Você ensinando pra Elizete as canções de canção do amor demais…”
A música era “Carta ao Tom” , de Vinicius de Morais, lançada em 1974. Ai eu pensei: como assim ensinando pra Elizete ? Afinal, conforme eu tinha aprendido com minha mãe, a Elizete Cardoso era a maior cantora brasileira, a diva da nossa música popular. Quem se atreveria ensinar a ela como cantar ? Era o maestro Tom Jobim , que insistia que Elizete entendesse como cantar junto daquele violonista, que a acompanharia em duas faixas (“Chega de saudade” e “Outra vez”) no disco, “Canção do amor demais” , gravado no início de 1958.
Elizete havia sido convencida por Vinicius e Tom a participar de um projeto de unir a música e a poesia dos dois em um disco. João, que se apresentava nas noites cariocas, havia impressionado Tom com sua batida diferente e ele o convidou para acompanhar Elizete em duas faixas do disco. A dificuldade era que Elizete cantava ainda de maneira convencional, com acentuação rítmica nas sílabas tônicas nos tempos fortes e abuso do vibrato. João havia simplesmente abolido esta técnica,simplificando o samba, mas através da utilização de uma harmonia mais sofisticada e mais densa. Por isto tiveram que ensinar a Elizete a esquecer do passado e cantar o samba da maneira que João tocava. Nascia a bossa-nova. Como explicou Vinicius em 1965:
“Um samba todo em voltas, onde cada compasso era uma queixa de amor, cada nota uma saudade de alguém longe. Mas a letra não vinha. Fiz 10, 20 tentativas. uma manhã, depois da praia, subitamente a resolução chegou. Queria, depois dos sambas do Orfeu, apresentar ao meu parceiro uma letra digna de sua nova música: pois eu realmente a sentia nova, caminhando numa direção a que não saberia dar nome ainda, mas cujo nome já estava implícito na criação. Era realmente a bossa nova que nascia, a pedir apenas, na sua interpretação, a divisão que João Gilberto descobriria logo depois (MORAES, 29/01/1965).
Estimulado por esta história é que eu procurei por João Gilberto e o inclui entre os meus favoritos. O resto é saudade…
Álbuns de estúdio
Chega de Saudade (Odeon, 1959) LP
O Amor, o Sorriso e a Flor (Odeon, 1960) LP
João Gilberto (Odeon, 1961) LP
Getz/Gilberto (Verve, 1964) LP
João Gilberto en México (Orfeon, 1970) LP
João Gilberto (Philips, 1970) LP
João Gilberto (Polydor, 1973) LP
The Best of Two Worlds (CBS, 1976) LP
Amoroso (Warner/WEA, 1977) LP
Brasil (WEA, 1981) LP
João (PolyGram, 1991) CD
João Voz e Violão (Universal/Mercury, 2000) CD
Álbuns ao vivo
Getz/Gilberto #2 (Verve, 1966) LP
João Gilberto Prado Pereira de Oliveira (Verve, 1966) LP
Live at the 19th Montreux Jazz Festival (WEA, 1986) 2LP
Eu sei que vou te amar (Epic, 1994) CD
João Gilberto live at Umbria Jazz (EGEA, 2002) CD
João Gilberto in Tokyo (Universal Music, 2004) CD
Um encontro no Au bon gourmet (Doxy, 2015) LP
Selections from Getz/Gilberto 76 (Resonance, 2015) LP
A minha geração e em certo grau, também a nova, estamos acostumados a pensar na década de ouro da música popular brasileira (MPB) como situada entre o final dos anos 1960 e o final dos 1970. Mas, será mesmo que esta década foi a melhor da MPB ? Começo a desconfiar. Quando me dispus a pesquisar, ancorado na pesquisa anterior do site Mais Tocadas, outras seleções, separadas por décadas, fui surpreendido. Nada que já não soubéssemos, mas quando colocadas em conjunto, as canções da década de 1930 constituem a verdadeira base para o que escutamos hoje e para a própria década de 1970 (o que, para sermos justos, sempre foi reconhecido por aquela “nova” geração). Convido-os a escutar esta primorosa seleção musical, incluindo essenciais como Pixinguinha, Noel Rosa, Ary Barroso, Lupicínio, Lamartine Babo, Braguinha, Vicente Celestino entre outros, aqui apresentada em versões atualizadas, o que sem dúvida ajuda a trazer estas belíssimas canções para um contexto mais atual, facilitando a sua degustação.
São 45 sucessos:
Minha Palhoça – Silvio Caldas (1935)
O que é que a bahiana tem – Dorival Caymmi (1939)
Tahi – Pra você gostar de mim – Joubert de Carvalho (1930)
As Pastorinhas – Braguinha (1938)
Cidade Maravilhosa – André F ilho (1934)
O Teu Cabelo Não Nega – Lamartine Babo, João e Raul Valença (1932)
Carinhoso – Pixinguinha, João de Barro (1917 e 1937)
Tico Tico no Fubá – Zequinha de Abreu (1917 e 1931)
Pierrot Apaixonado – Joel e Gaucho (1936)
Linda Morena – Lamartine Babo (1933)
Sonho de Papel – Alberto Ribeiro (1935)
Camisa Amarela – Ary Barroso (1939)
Na Pavuna – Almirante (1930)
Camisa Listrada – Assis Valente )1938)
Na Batucada da Vida – Ary Barroso (1934)
Maringá – Joubert de Carvalho (1932
Chão de Estrelas – Silvio Caldas (1937)
Se Você Jurar – Ismael Silva (1931)
O Ébrio – Vicente Celestino (1936)
O Orvalho Vem Caindo – Noel Rosa (1933)
Meu Moreno – Hervé Cordovil (1935)
A Jardineira – Humberto Porto, Benedito Lacerda (1938)
Se Acaso Você Chegasse – Lupicínio Rodrigues (1938)
Agora é Cinza – Bide e Marçal (1934)
Para Me Livrar do Mal – Noel Rosa (1932)
De Papo pro Ar – Joubert de Carvalho (1931)
Mágoas de Caboclo – Leonel Azevedo, J.Cascata (1936)
Não tem Tradução – Noel Rosa (1933)
No Rancho Fundo – Ary Barroso, Lamartine Babo (1939)
Na Baixa do Sapateiro – Ary Barroso (1938)
Andorinha Preta – Breno Ferreira (1932)
Com que Roupa – Noel Rosa (1931)
No Tabuleiro da Bahiana – Ary Barroso (1936)
Feitiço da Vila – Noel Rosa (1935)
Aquarela do Brasil – Ary Barroso (1939)
Touradas em Madrid – Braguinha (1938)
Lábios que Beijei – Leonel Azevedo, J.Cascata (1937)
Deusa da Minha Rua – Newton Teixeira, Jorge Faraj (1939)
Singing in the Rain – Arthur Freed e Nacio Herb Brown (1929)
Yes Nós Temos Banana – Braguinha (1939)
Não Tenho Lágrimas – Maximiliano Bulhões e Milton de Oliveira (1937)
Iniciamos mais uma série: As mais tocadas no Brasil. A pergunta básica é : quanto uma música lançada há quase um século ainda embala os nossos saraus, colore ou faz pano de fundo a vários de nossos momentos atuais ?
Começamos com a década 1920-1930. Nenhum de nós era provavelmente nascido, mas garanto que das 30 canções selecionadas todo mundo conhece pelo menos umas 5. Não coloquei as gravações originais, mas deixo um link par quem quiser ouvi-las no site : Mais tocadas
Um dos programas musicais que mais me marcou quando ainda era criança (tinha 11 anos) foi oFestival de Música Popular Brasileira de 1967, a terceira edição do Festival de MPB organizado pela TV Record de SÒ Paulo. Ele aconteceu entre 30 de setembro e 21 de outubro de 1967, no Teatro Record Centro, em São Paulo, com apresentação de Sônia Ribeiro e Blota Júnior.
Quem não assistiu não tem ideia do impacto que ele causou em todo país. Uma nação acostumada a cantar boleros, mal iniciada na Bossa Nova e na Jovem Guarda foi de repente invadida por uma série de conceitos musicais novos. A música podia ser tradicional, o samba modernizado, o rock abrasileirado, a música brasileira eletrificada, as letras passaram a retratar o cotidiano, a propiciar o protesto e a esperança. Se como apenas isto já não bastasse toda uma geração de gênios musicais estava sendo lançada, ou consagrada ali: Edu Lobo, Chico Buarque, Caetano Veloso, Gilberto Gil, Marília Medalha, MPB-4, Mutantes, Elis Regina, Jair Rodrigues, Nara Leão, Dori Caymmi, Roberto Carlos, foram apenas algumas das atrações envolvidas na disputa.
Para mim era impossível escolher a melhor e o público se dividiu e torcia como em uma partida de futebol, aplaudindo e cantando as suas favoritas e vaiando intensamente as suas concorrentes. A canção vencedora do festival foi “Ponteio”, de Edu Lobo e Capinam, interpretado pelo primeiro e por Marília Medalha. Para vocês terem uma ideia, foi neste festival que foram apresentadas originalmente Alegria, Alegria, de Caetano Veloso; Roda Viva, de Chico Buarque e Domingo no Parque, de Gilberto Gil, esta última sendo considerada marco inicial da Tropicália.
E o melhor, a Grande Final foi preservada, e pode ser assistida na íntegra. Eu me diverti muito revendo este programa que agora trazemos para vocês: